quinta-feira, 22 de novembro de 2012

A mênade e o monge

Não se falavam muito. Estavam afinal, cada um sentado em uma montanha, com uma ravina enorme entre eles. E para quem olhasse sem saber, nada seria mais diferente do que aqueles dois.

Ele, com suas vestes compridas e escuras, e seu chapéu, sua barba densa, seu silêncio, seu rosário.
Ela, vestida de açafrão, sua coroa de hera, seus pés descalços, seu grito, seu tirso.

Mas quando a manhã a encontrou deitada sob o sol que nascia, apoiada no rochedo olhando o céu, ele estava de mãos erguidas na direção do mesmo sol, e cantava, um tom grave e monocórdio que a comoveu. E ele sentou sobre o rochedo da sua própria montanha, e contemplaram em silêncio o mesmo céu durante horas.

E quando ela dançou, diante do fogo do altar, hineando seu senhor com palavras amorosas sob as estrelas, ele se comoveu. E respondeu com as palavras de amor que dedicava ao seu próprio senhor. E um canto respondia ao outro.

Sentados na beira do abismo, balançando os pés no vazio, conversavam sobre amor, as palavras entrecortadas sendo carregadas pelo vento. Precisavam esperar o vento mudar de direção, para ouvirem a resposta do outro. Mas agradeciam a gentileza do vento mesmo assim. E eram dois adolescentes falando dos Amados, trocando confidências de primeiro amor.

Ela descia a montanha e se encontrava com mulheres que riam e filósofos de estranho olhar. E ele descia a montanha e se encontrava com homens que riam e filósofas de estranho olhar. E se encontravam nas mesmas assembléias para falar de história, política e poesia, e subiam de volta suas montanhas com belas lembranças.

Ela se encontrava com sátiros e ninfas, e bons daemons que levavam sua voz ao éter. Ele se encontrava com ninfas e sátiros, e anjos que levavam sua voz ao éter.

Seus cantos falavam de um deus que tinha longos cachos e caminhava pelo mundo levando alegria e vinho. Falavam de sacrifício divino e de libertação. E cada um com sua voz e sua visão, viviam a delícia do amor divino.

Contemplação e dança, oração e canto, e acima de tudo, o amor apaixonado por um deus.

Diferentes deuses, diferentes vozes. O mesmo amor pelo Amado, a mesma contemplação da doçura. A mesma escura noite.

Não importava o que dissessem nas cidades, aqueles que seguiam ao invés de amar. Ali nas montanhas, olhavam com carinho um para o outro os dois eremitas.

Só os apaixonados compreendem outro apaixonado...



para um querido amigo que me faz acreditar possível a paz e o respeito.

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